TRÊS FORMAS DE
AMOR
De CASTRO ALVES
Análise do poema OS TRÊS AMORES
Diego Barros, Tatiana Blumenthal e
Willian Sousa
Resumo:
Este trabalho/ensaio tem por objetivo analisar o poema OS TRÊS AMORES de Antônio
de Castro Alves por meio de uma análise estrutural e interna, bem como os seus possíveis
significados dentro do contexto histórico e movimento literário da época no qual
estava inserido, escrito e publicado.
Summary: This work/assay has as objective the analysis
of the poem OS TRÊS AMORES by Antônio de Castro Alves with an internal and
structural view, as well as its possible meanings within the historical context
and literary movement from the time, which it was inserted, written and
published.
INTRODUÇÃO
Antônio Frederico de Castro Alves, popularmente conhecido apenas por Castro Alves, nasceu na vila de
Nossa Senhora da Conceição de "Curralinho", hoje chamada de Castro
Alves, no estado da Bahia, no dia 14 de março de 1847.
Castro
Alves pertence ao condoreirismo, que é a terceira fase do romantismo. O
movimento tem o social como temática principal. Os autores da época
questionavam a escravidão e apoiavam a proclamação da república. Alves
é o principal poeta condoreiro, razão essa
por ser conhecido como o "Poeta dos Escravos". Fagundes
Varela, Tobias Barreto e Luís Delfino também fazem parte do movimento.
Rapaz belo e esbeltico, com voz possante, cheio de maneiras que deixavam
as pessoas impressionadas, impondo-se à admiração dos homens e roubando amores das
mulheres, fez-nos sentir em seus versos então os primeiros romances.
O poema que conhecemos hoje como O Navio Negreiro teve sua apresentação
pública em 7 de setembro de 1868 pelo nome de Tragédia no mar.
Porém em São Paulo, na tarde de 11 de novembro, resolveu caçar na várzea
do Brás e feriu o pé com um tiro. Daí resultou longa enfermidade, cirurgias,
chegando ao Rio de Janeiro no começo de 1869, para salvar-se, mas com o sofrimento
de uma amputação.
Seguiu para Curralinho em fevereiro de 1870 para melhorar a tuberculose,
doença
que acometia muitas pessoas na época. Voltou para Salvador em setembro e lançou Espumas flutuantes, última obra publicada em vida, pois veio a
falecer um ano depois, no dia 06 de Julho de 1871, aos 24 anos.
Infelizmente,
Alves morreu antes que os escravos fossem libertados, a Lei Áurea foi assinada apenas
em 1888.
O
Livro
Foto da Capa da primeira edição. |
Espumas flutuantes (1870)
é o resultado de 53 poemas reunidos e resumem todos os traços inovadores
de Castro Alves. O nome do livro não comum passa uma forte idéia de
transitoriedade: abatido sente que sua vida se esvai assim como as espumas no
mar agitado, frente a proximidade da morte. A coletânea inclui poemas exímios,
como: O livro e a América, Ahasverus e o gênio, Mocidade
e morte, Adormecida, Ode ao dois de julho, etc. A
obra foi tomada pela crítica com enorme admiração e respeito, legitimando Castro
Alves no cenário literário no Brasil.
O prologo
No "Prólogo", Castro Alves responde a
própria pergunta "o que são na verdade estes meus cantos?":
"Como
as espumas, que nascem do mar e do céu, da vaga e do vento, eles são filhos da musa
- este sopro do alto; do coração - este pélado da alma. E como as espumas são,
às vezes, a flora sombria da tempestade, eles por vezes rebentaram ao estalar
fatídico do látego da desgraça(…)"
Os versos surgem como exímios exemplares do Romantismo, carregados
de figuras de linguagem e em tom muitas vezes pomposo.
Relembra de amores, consumados ou não, desferindo o fervor que o fim da
paixão com a atriz Eugênia Câmara lhe causou - uma "Immensis orbibus
anguis", que: "Assim bebeu-te a vida, a mocidade e a crença /
Não boca de mulher… mas de fatal serpente!…"
A seguir,
apresentaremos o poema.
Os Três
Amores
I Minh’alma é como a fronte sonhadora Do louco bardo, que Ferrara chora... Sou Tasso!... a primavera de teus risos De minha vida as solidões enflora... Longe de ti eu bebo os teus perfumes, Sigo na terra de teu passo os lumes... - Tu és Eleonora... II Meu coração desmaia pensativo, Cismando em tua rosa predileta. Sou teu pálido amante vaporoso, Sou teu Romeu... teu lânguido poeta!... Sonho-te às vezes virgem... seminua... Roubo-te um casto beijo à luz da lua... - E tu és Julieta... III Na volúpia das noites andaluzas O sangue ardente em minhas veias rola... Sou D. Juan!... Donzelas amorosas, Vós conheceis-me os trenos na viola! Sobre o leito do amor teu seio brilha Eu morro, se desfaço-te a mantilha Tu és - Júlia, a Espanhola!... Recife, Setembro de 1866 |
ANALISE
ESTRUTURAL
Rimas
O
esquema das rimas repete-se em ABABDDB nas duas últimas estrofes, com exceção
da primeira, observe:
Minh’alma é como a fronte
sonhadora
Do louco bardo, que Ferrara chora... Sou Tasso!... a primavera de teus risos De minha vida as solidões enflora... Longe de ti eu bebo os teus perfumes, Sigo na terra de teu passo os lumes... - Tu és Eleonora... |
A
B
C
A
D
D
B
|
Considerando
a ordem que seguem as rimas no poema, podemos confundir-nos e achar que Castro
Alves não seguiu uma métrica padronizada, se analisarmos apenas uma estrofe,
pois esta apresenta rimas mistas. Porém ao analisar o poema por inteiro notamos
que o esquema rítmico está em completa harmonia, conectando através da
sonoridade uma estrofe com a outra. Ainda que as rimas A, B, C e D não sejam as
mesmas em cada estrofe, a repetição da ordem em que as variações aparecem foi
planejada com maestria.
Analisando
o esquema rítmico, e as rimas do poema, percebemos que o autor tráz a cada
septilha algumas rimas ricas e algumas pobres: podemos observar que na primeira
sétima as rimas B são palavras das classes de verbo e substantivo, assim como
as D. Já na segunda estrofe as rimas B são adjetivos e substantivos, enquanto
as D são respectivamente adjetivo e substantivo.
Sílabas poéticas, escanção e ritmo.
Ao
analisar as sílabas poéticas é possível notar que as sílabas fortes repetem-se
de forma a constituir o ritmo do poema, auxiliando sua sonoridade e dando a ele
um tom que remete ou relembra o balanço dos amores e paixões por ele
representado. Observamos também fuga do padrão quando se trata do local onde
estão entonadas as sílabas mais fortes ou acentuadas.
I
Mi- NHA ͡͡ AL- ma͡͡ é- co- mo- a- FRON- te- so- nha- DO
(ra)
1 2 3
4
5 6
7 8 9
10 11
Do- LOU- co- BAR-
do,- que- fer- Ra- ra- CHO (ra)...
1 2 3 4 5
6 7 8
9 10
SOU- TAS- so- a-
pri- ma- VE- ra- de- teus- RI (sos)
1
2 3
4 5 6 7 8 9
10 11
De- mi- nha- VI- da
͡͡͡ as- so- li- DÕES- en- FLO (ra)
1
2 3 4 5
6 7
8 9 10
LON- ge- de- TI-
eu- BE- bo ͡͡͡ os- teus- per- FU (mes)
1 2
3 4 5
6 7
8 9 10
11
Si- go- na- TER-
ra- de- teu- PAS- so ͡͡͡ os- LU (mes)
1
2 3 4 5 6
7 8 9
10
E- tu- ÉS- E- le-
o- NO (ra)
1
2 3 4
5 6 7
II
MEU- co- ra- ÇÃO-
des- MA- ia- pen- sa- TI (vo)
1 2
3 4
5 6 7
8 9 10
Cis- MAN- do
͡͡͡ em- tua- RO- sa- pre- di- LE (ta)
1
2 3 4
5
6 7 8 9
SOU- teu- PÁ- li-
do ͡͡͡ a- MAN- te- va- po- RO (so)
1 2
3 4 5 6
7 8 9
10
Sou- TEU- Ro- MEU-
teu- LÂN- gui- do- po- E (ta)
1 2 3 4
5
6 7 8
9 10
SO- nho- te
͡͡͡ às- ve- zes- VIR- gem- se- mi- NUA
1
2 3
4 5 6 7
8 9 10
ROU- bo- te
͡͡͡ um- CAS- to- BEI- jo- à- luz- da-
LUA
1 2
3 4 5
6 7 8 9
10 11
E- tu- ÉS- Ju- li-
E (ta)
1 2
3 4 5 6
III
Na- vo- LÚ- pia-
das- NOI- tes- an- da- LU (zas)
1
2 3 4 5
6 7 8
9 10
O- SAN-
gue͡͡͡ ar- DEN- te͡͡͡ em- mi- nhas- VEI-
as- RO (la)
1
2 3 4 5
6 7 8 9
10
SOU- D.- Ju- AN-
Don- ZE- las- a- mo- RO (sas)
1
2 3 4 5
6 7 8
9 10
VÓS- co- nhe-
CEIS- me͡͡͡ os- TRE- nos- na- vi- O (la)
1
2 3 4
5
6 7 8
9 10
So- bre͡͡͡ o- LEI-
to- do͡͡͡ a- MOR- teu- SEI- o- BRI (lha)
1
2 3 4
5 6 7
8 9 10
Eu- MOR- ro- se-
des- FA- ço- te͡͡͡ a- man- TI (lha)
1
2 3 4
5 6 7
8 9 10
Tu- ÉS- JÚ- li- a
͡͡ a- Es- pa- NHO (la)
1
2 3 4
5 6 7
8
O
padrão, e o mais comum, é que versos seguidos por oito sílabas métricas possuam
entonação distribuída da seguinte maneira: E.R. 8(4-8) ou E.R. 8(2-6-8), porém
podemos observar no último verso da terceira estrofe, que isto não se segue,
afinal ele tem suas entonações mais fortes distribuídas em E.R. 8(2-3-8). O
mesmo ocorre com o verso eneassílabo, que se contrapondo ao padrão, possui suas
entonações em E.R. 9(2-5-9). Assim seguiu o poema, não deixando de fora os
decassílabos, quando podemos observar o contrário no segundo verso da primeira
estrofe, nos versos um, três, quatro e cinco da segunda estrofe, e em todos –
exceto o último, que possui apenas oito sílabas métricas – os versos da última
estrofe. Por último observamos que os hendecassílabos também fogem ao padrão,
estando distribuídos como E.R. 11(2-7-11); E.R. 11(1-2-7-11); E.R. 11(1-4-6-11)
e E.R. 11(1-4-6-11).
ANALISE INTERNA
Há
pesquisadores que especulam o significado deste poema como exemplificação ou
alusão ao amor nas três fases do romantismo. Cada estrofe em concordância com
cada fase respectivamente. Entretanto, se pensarmos e observarmos o poema como
todo e suas referências, tal afirmação torna-se dúbia pois, o amor no
romantismo de fato foi exagerado e idealizado, mas apenas na segunda fase
conhecida como ultrarromantismo. A terceira estrofe também não diz respeito ao
fim do romantismo, pois esse conhecido como condoreirismo, tinha como temática
as questões sociais.
Se
levarmos em consideração quando Castro Alves escreveu o poema (Recife, 1866),
pode-se especular mais acertadamente que o poeta tenha o escrito para sua amada
Eugenia Câmara, mesmo ano que ambos se conheceram. No poema, Castro cita três diferentes
situações em que se vê com sua amada. Faz referência a três importantes obras conhecidas
na literatura mundial para descrever os momentos com a atriz. Obras essas: Torquato Tarso (Opera), Romeu e Julieta e O Trapaceiro de Servilha e o convidado de Pedra. Observe:
I
Minh’alma é como a fronte sonhadora
Do louco bardo, que Ferrara chora...
Sou Tasso!... a primavera de teus risos
De minha vida as solidões enflora...
Longe de ti eu bebo os teus perfumes,
Sigo na terra de teu passo os lumes...
- Tu és Eleonora...
Minh’alma é como a fronte sonhadora
Do louco bardo, que Ferrara chora...
Sou Tasso!... a primavera de teus risos
De minha vida as solidões enflora...
Longe de ti eu bebo os teus perfumes,
Sigo na terra de teu passo os lumes...
- Tu és Eleonora...
A
primeira estrofe é referência a Torquato
Tasso Opera de Gaetano Donizetti, se passa na Itália e é baseado na vida do
grande poeta Torquato Tasso, sendo Ferrara
a cidade onde a história principal acontece. O romance entre Tasso e Eleonora é cheio de desencontros, escândalos e, ao fim, a perda da
amada.
II
Meu coração desmaia pensativo,
Cismando em tua rosa predileta.
Sou teu pálido amante vaporoso,
Sou teu Romeu... teu lânguido poeta!...
Sonho-te às vezes virgem... seminua...
Roubo-te um casto beijo à luz da lua...
- E tu és Julieta...
Meu coração desmaia pensativo,
Cismando em tua rosa predileta.
Sou teu pálido amante vaporoso,
Sou teu Romeu... teu lânguido poeta!...
Sonho-te às vezes virgem... seminua...
Roubo-te um casto beijo à luz da lua...
- E tu és Julieta...
Nesta
estrofe, a referência é à obra mundialmente famosa Romeu e Julieta de William Shakespeare. Também se passa na Itália,
Verona, onde o amor impossível e proibido entre dois jovens de famílias rivais,
uma paixão intensa então termina de forma trágica. Este trecho se comunica
perfeitamente com o ultrarromantismo, evidenciado pelos os vocábulos “desmaia”, “pálido”, “lânguido” e “à luz da lua”, termos de escapismo,
sentimentalismo e temática noturna.
III
Na volúpia das noites andaluzas
O sangue ardente em minhas veias rola...
Sou D. Juan!... Donzelas amorosas,
Vós conheceis-me os trenos na viola!
Sobre o leito do amor teu seio brilha
Eu morro, se desfaço-te a mantilha
Tu és - Júlia, a Espanhola!...
A
última estrofe é uma menção a obra O
Trapaceio de Sevilha e o convidado de pedra de Tirso de Molina, onde o
personagem principal é Don Juan:
jovem atraente que seduz Julia, uma moça de família nobre da Espanha e
assassina seu pai. Trata se de um amor sedutor, carnal e amaldiçoado, também
com um fim dramático.
Chegamos
à conclusão que Os Três Amores
insinua que Castro Alves e Eugênia não tiveram um romance dos melhores pelas
citações dos três personagens literários. Em todas as três obras, o amor tem um
final trágico, dramático e clássico. Neste romance há de tudo: paixão, escândalos,
desencontros, barreiras e ao fim a perda da amada ou maldição do amante, mas
que ambos viveram intensamente cada momento.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como
já dito anteriormente, Castro Alves era um poeta do condoreirismo, terceira
fase do romantismo. A preocupação com a métrica começava a se esvair, e
características pelo qual passaram inúmeros movimentos literários neste
processo de fugir às regras podem ser observadas no poema Os Três Amores, onde
a métrica é seguida quase à risca, porém escorrega em alguns momentos, fugindo
do padrão.
Tais
“escapes” podem ser observados, por exemplo, na contagem das sílabas poéticas,
que não seguem sempre o mesmo número.
Apesar
de alguns pesquisadores relacionarem o poema às três fases do Romantismo, uma
análise mais atenta juntamente com a consideração do contexto histórico, nos
possibilitou concluir mais acertadamente que Castro Alves o dedicou à sua amada
Eugenia Câmara, comparando o amor de ambos epicamente com os grandes amores
clássicos e literários de outros autores mundialmente conhecidos.
São
por estes motivos que tornam o talento e maestria de Castro Alves, o “Poeta dos
escravos”, indubitáveis.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Norma Seltzer. Versos, sons, ritmos. 14ª Ed. rev e atualizada. São Paulo:
Ática, 2006.
BOSI,
Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. 43ª Ed. São Paulo.
Cultrix, 2003.
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[S.I]. Acervo Digital. [2000?]. Disponível em:
<http://objdigital.bn.br/Acervo_Digital/Livros_eletronicos/espumas_flutuantes.pdf
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e Julieta. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. [S.l.]: Wikimedia Foundation,
última atualização: 22 de maio. 2015. Disponível em: <
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última atualização: 19 de março. 2014. Disponível em: <
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Tasso (Opera). In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. [S.l.]: Wikimedia Foundation,
última atualização: 05 de março. 2015. Disponível em: < http://it.wikipedia.org/wiki/Torquato_Tasso_%28opera%29>.
Acesso em: 27 de Maio, 2015.
DON
Juan. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. [S.l.]: Wikimedia Foundation,
última atualização: 15 de fevereiro. 2015. Disponível em: <
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CASTRO
Alves. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. [S.l.]: Wikimedia Foundation,
última atualização: 04 de maio. 2015. Disponível em: <
http://pt.wikipedia.org/wiki/Castro_Alves >. Acesso em: 27 de Maio, 2015.
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